1. A linguagem popular ou coloquial
É aquela usada espontânea e fluentemente pelo povo. Mostra-se quase sempre rebelde à norma gramatical e é carregada de vícios de linguagem (solecismo - erros de regência e concordância; barbarismo - erros de pronúncia, grafia e flexão; ambigüidade; cacofonia; pleonasmo), expressões vulgares, gírias e preferência pela coordenação, que ressalta o caráter oral e popular da língua. A linguagem popular está presente nas mais diversas situações: conversas familiares ou entre amigos, anedotas, irradiação de esportes, programas de TV (sobretudo os de auditório), novelas, expressão dos estados emocionais etc.
2. A linguagem culta ou padrão
É aquela ensinada nas escolas e serve de veículo às ciências em que se apresenta com terminologia especial. É usada pelas pessoas instruídas das diferentes classes sociais e caracteriza-se pela obediência às normas gramaticais. Mais comumente usada na linguagem escrita e literária, reflete prestígio social e cultural. É mais artificial, mais estável, menos sujeita a variações. Está presente nas aulas, conferências, sermões, discursos políticos, comunicações científicas, noticiários de TV, programas culturais etc.
3. Gíria
Segundo Mattoso Câmara Júnior, “estilo literário e gíria são, em verdade, dois pólos da Estilística, pois gíria não é a linguagem popular, como pensam alguns, mas apenas um estilo que se integra à língua popular”. Tanto que nem todas as pessoas que se exprimem através da linguagem popular usam gíria.
A gíria relaciona-se ao cotidiano de certos grupos sociais “que vivem à margem das classes dominantes: os estudantes, esportistas, prostitutas, ladrões” (Dm0 Preti) como arma de defesa contra as classes dominantes. Esses grupos utilizam a gíria como meio de expressão do cotidiano, para que as mensagens sejam decodificadas apenas pelo próprio grupo.
Assim a gíria é criada por determinados segmentos da comunidade social que divulgam o palavreado para outros grupos até chegar à mídia. Os meios de comunicação de massa, como a televisão e o rádio, propagam os novos vocábulos, às vezes, também inventam alguns. A gíria que circula pode acabar incorporada pela língua oficial, permanecer no vocabulário de pequenos grupos ou cair em desuso.
Caracterizada como um vocabulário especial a gíria surge como um signo de grupo, a princípio secreto, domínio exclusivo de uma comunidade social restrita (seja a gíria dos marginais ou da polícia, dos estudantes, ou de outros grupos ou profissões).
(...) Ao vulgarizar-se, porém, para a grande comunidade, assumindo a forma de uma gíria comum, de uso geral e não diferenciado, (...) torna-se difícil precisar o que é de fato vocábulo gírio ou vocábulo popular
(...) É expressa freqüentemente sob forma humorística (e não raro obscena, ou ambas as coisas juntas), como ocorre, por exemplo, em certos signos que revelam evidente agressividade, como bicho, forma de chamamento que na década de 1970 substituía amigo, colega, cara; coroa, para pessoa mais idosa, madura; quadrado, em lugar de conservador tradicional, reacionário; mina, para namorada, forma trazida da linguagem marginal da prostituição, onde origina lmente signca mulher rendosa para o malandro, que vive à custa dela etc.
(Dino Pretti)
Primeiro, ela pinta como quem não quer nada. Chega na moral, dando uma de Migué, e acaba caindo na boca do povo. Depois desba ratina, vira lero-lero, sai de fininho e some. Mas, às vêzes, volta arrebentando, sem o menor aviso. Afinal, qual é a da gíria?
(Cássio Schubsky, Superinteressante)
4. Linguaguem vulgar
Existe uma linguagem vulgar, segundo Dino Preti, “ligada aos grupos extremamente incultos, aos analfabetos”, aos que têm pouco ou nenhum contato com centros civilizados. Na linguagem vulgar multiplicam-se estruturas com “nóis vai, ele fica”, “eu di um beijo nela”, “Vamo i no mercado”.
5. Linguaguem regional
Regionalismos ou falares locais são variações geográficas do uso da língua padrão, quanto às construções gramaticais, empregos de certas palavras e expressões e do ponto de vista fonológico. Há, no Brasil, por exemplo, falares amazônico, nordestino, baiano, fluminense, mineiro, sulino.
Ex.: falar gaúcho.
Pues, diz que o divã no consultório do analista de Bagé é forrado com um pelego. Ele recebe os pacientes de bombacha e pé no chão.
Buenas. Vá entrando e se abanque, índio velho.
— O senhor quer que eu deite logo no divã?
— Bom, se o amigo quiser dançar uma marcha, antes, esteja a gosto. Mas eu prefiro ver o vivente estendido e charlando que nem china da fronteira, pra não perder tempo nem dinheiro.
(Luís Fernando Veríssimo, O Analista de Bagé)
Ex.: falar caipira.
Aos dezoito anos pai Norato deu uma facada num rapaz, num adjutório, e abriu o pé no mundo. Nunca mais ninguém botou os olhos em riba dele, afora o afilhado.
— Padrinho, evim cá chamá o sinhô pra mode i morá mais eu.
— Quá,flo, esse caco de gente num sai daqui mais não.
— Bamo. Buli gente num bole, mais bicho... O sinhô anda perrengado...
(Bernardo Élis, Pai Norato)
A língua é um código de que se serve o homem para elaborar mensagens, para se comunicar.
Existem basicamente duas modalidades de língua, ou seja, duas línguas funcionais:
1) a língua funcional de modalidade culta, língua culta ou língua-padrão, que compreende a língua literária, tem por base a norma culta, forma lingüística utilizada pelo segmento mais culto e influente de uma sociedade. Constitui, em suma, a língua utilizada pelos veículos de comunicação de massa (emissoras de rádio e televisão, jornais, revistas, painéis, anúncios, etc.), cuja função é a de serem aliados da escola, prestando serviço à sociedade, colaborando na educação, e não justamente o contrário;
2) a língua funcional de modalidade popular; língua popular ou língua cotidiana, que apresenta gradações as mais diversas, tem o seu limite na gíria e no calão.
Norma culta:
A norma culta, forma lingüística que todo povo civilizado possui, é a que assegura a unidade da língua nacional. E justamente em nome dessa unidade, tão importante do ponto de vista político-cultural, que é ensinada nas escolas e difundida nas gramáticas.
Sendo mais espontânea e criativa, a língua popular se afigura mais expressiva e dinâmica. Temos, assim, à guisa de exemplificação:
Estou preocupado. (norma culta)
Tô preocupado. (língua popular)
Tô grilado. (gíria, limite da língua popular)
Não basta conhecer apenas uma modalidade de língua; urge conhecer a língua popular, captando-lhe a espontaneidade, expressividade e enorme criatividade, para viver; urge conhecer a língua culta para conviver.
Podemos, agora, definir gramática: é o estudo das normas da língua culta.
O conceito de erro em língua:
Em rigor, ninguém comete erro em língua, exceto nos casos de ortografia. O que normalmente se comete são transgressões da norma culta. De fato, aquele que, num momento íntimo do discurso, diz: "Ninguém deixou ele falar", não comete propriamente erro; na verdade, transgride a norma culta.
Um repórter, ao cometer uma transgressão em sua fala, transgride tanto quanto um indivíduo que comparece a um banquete trajando xortes ou quanto um banhista, numa praia, vestido de fraque e cartola.
Releva considerar, assim, o momento do discurso, que pode ser íntimo, neutro ou solene.
O momento íntimo é o das liberdades da fala. No recesso do lar, na fala entre amigos, parentes, namorados, etc., portanto, são consideradas perfeitamente normais construções do tipo:
Eu não vi ela hoje.
Ninguém deixou ele falar.
Deixe eu ver isso!
Eu te amo, sim, mas não abuse!
Não assisti o filme nem vou assisti-lo.
Sou teu pai, por isso vou perdoá-lo.
Nesse momento, a informalidade prevalece sobre a norma culta, deixando mais livres os interlocutores.
O momento neutro é o do uso da língua-padrão, que é a língua da Nação. Como forma de respeito, tomam-se por base aqui as normas estabelecidas na gramática, ou seja, a norma culta. Assim, aquelas mesmas construções se alteram:
Eu não a vi hoje.
Ninguém o deixou falar.
Deixe-me ver isso!
Eu te amo, sim, mas não abuses!
Não assisti ao filme nem vou assistir a ele.
Sou seu pai, por isso vou perdoar-lhe.
Considera-se momento neutro o utilizado nos veículos de comunicação de massa (rádio, televisão, jornal, revista, etc.). Daí o fato de não se admitirem deslizes ou transgressões da norma culta na pena ou na boca de jornalistas, quando no exercício do trabalho, que deve refletir serviço à causa do ensino, e não o contrário.
O momento solene, acessível a poucos, é o da arte poética, caracterizado por construções de rara beleza.
Vale lembrar, finalmente, que a língua é um costume. Como tal, qualquer transgressão, ou chamado erro, deixa de sê-lo no exato instante em que a maioria absoluta o comete, passando, assim, a constituir fato lingüístico registro de linguagem definitivamente consagrado pelo uso, ainda que não tenha amparo gramatical.
Exemplos:
Olha eu aqui! (Substituiu: Olha-me aqui!)
Vamos nos reunir. (Substituiu: Vamo-nos reunir.)
Não vamos nos dispersar. (Substituiu: Não nos vamos dispersar e Não vamos dispersar-nos.)
Tenho que sair daqui depressinha. (Substituiu: Tenho de sair daqui bem depressa.)
O soldado está a postos. (Substituiu: O soldado está no seu posto.)
Têxtil, que significa rigorosamente que se pode tecer, em virtude do seu significado, não poderia ser adjetivo associado a indústria, já que não existe indústria que se pode tecer. Hoje, porém, temos não só como também o operário têxtil, em vez da indústria de fibra têxtil e do operário da indústria de fibra têxtil.
As formas impeço, despeço e desimpeço, dos verbos impedir, despedir e desimpedir, respectivamente, são exemplos também de transgressões ou "erros" que se tornaram fatos lingüísticos, já que só correm hoje porque a maioria viu tais verbos como derivados de pedir, que tem, início, na sua conjugação, com peço. Tanto bastou para se arcaizarem as formas então legítimas impido, despido e desimpido, que hoje nenhuma pessoa bem-escolarizada tem coragem de usar.
Em vista do exposto, será útil eliminar do vocabulário escolar palavras como corrigir e correto, quando nos referimos a frases. "Corrija estas frases" é uma expressão que deve dar lugar a esta, por exemplo: "Converta estas frases da língua popular para a língua culta".
Uma frase correta não é aquela que se contrapõe a uma frase "errada"; é, na verdade, uma frase elaborada conforme as normas gramaticais; em suma, conforme a norma culta.
Língua escrita e língua falada. Nível de linguagem:
A língua escrita, estática, mais elaborada e menos econômica, não dispõe dos recursos próprios da língua falada.
A acentuação (relevo de sílaba ou sílabas), a entoação (melodia da frase), as pausas (intervalos significativos no decorrer do discurso), além da possibilidade de gestos, olhares, piscadas, etc., fazem da língua falada a modalidade mais expressiva, mais criativa, mais espontânea e natural, estando, por isso mesmo, mais sujeita a transformações e a evoluções.
Nenhuma, porém, se sobrepõe a outra em importância. Nas escolas principalmente, costuma se ensinar a língua falada com base na língua escrita, considerada superior. Decorrem daí as correções, as retificações, as emendas, a que os professores sempre estão atentos.
Ao professor cabe ensinar as duas modalidades, mostrando as características e as vantagens de uma e outra, sem deixar transparecer nenhum caráter de superioridade ou inferioridade, que em verdade inexiste.
Isso não implica dizer que se deve admitir tudo na língua falada. A nenhum povo interessa a multiplicação de línguas. A nenhuma nação convém o surgimento de dialetos, conseqüência natural do enorme distanciamento entre uma modalidade e outra.
A língua escrita é, foi e sempre será mais bem-elaborada que a língua falada, porque é a modalidade que mantém a unidade lingüística de um povo, além de ser a que faz o pensamento atravessar o espaço e o tempo. Nenhuma reflexão, nenhuma análise mais detida será possível sem a língua escrita, cujas transformações, por isso mesmo, se processam lentamente e em número consideravelmente menor, quando cotejada com a modalidade falada.
Importante é fazer o educando perceber que o nível da linguagem, a norma lingüística, deve variar de acordo com a situação em que se desenvolve o discurso.
O ambiente sociocultural determina. O nível da linguagem a ser empregado. O vocabulário, a sintaxe, a pronúncia e até a entoação variam segundo esse nível. Um padre não fala com uma criança como se estivesse dizendo missa, assim como uma criança não fala como um adulto. Um engenheiro não usará um mesmo discurso, ou um mesmo nível de fala, para colegas e para pedreiros, assim como nenhum professor utiliza o mesmo nível de fala no recesso do lar e na sala de aula.
Existem, portanto, vários níveis de linguagem e, entre esses níveis, se destacam em importância o culto e o cotidiano, a que já fizemos referência.
A gíria:
Ao contrário do que muitos pensam, a gíria não constitui um flagelo da linguagem. Quem, um dia, já não usou bacana, dica, cara, chato, cuca, esculacho, estrilar?
O mal maior da gíria reside na sua adoção como forma permanente de comunicação, desencadeando um processo não só de esquecimento, como de desprezo do vocabulário oficial. Usada no momento certo, porém, a gíria é um elemento de linguagem que denota expressividade e revela grande criatividade, desde que, naturalmente, adequada à mensagem, ao meio e ao receptor. Note, porém, que estamos falando em gíria, e não em calão.
Ainda que criativa e expressiva, a gíria só é admitida na língua falada. A língua escrita não a tolera, a não ser na reprodução da fala de determinado meio ou época, com a visível intenção de documentar o fato, ou em casos especiais de comunicação entre amigos, familiares, namorados, etc., caracterizada pela linguagem informal.
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